Brazil - BRAZZIL - Theater Play - "Vestido de Noiva" Part 3, by Nelson Rodrigues - In Portuguese - Brazilian Literature - Portuguese Language - Brazilian Books & Authors - April 2001


Brazzil
April 2001
Literature

Wedding Gown

I'll make a scandal. If I tell something I know!...
Don't provoke me, Alaíde. I should be the bride!
You're a monster! The only man I loved. I never married
my sweethearts. But I never had your impudence.

Nelson Rodrigues

THIRD OF THREE PARTS

(Sai. Lúcia senta-se na banqueta. Luz no plano da alucinação.)

ALAÍDE (evocativa)—Você foi apunhalada por um colegial.

CLESSI (admirada)—Quer dizer que Lúcia e a mulher de véu são a mesma pessoa!

ALAÍDE (sempre evocativa)—...um menino de 17 anos matou você. (abstrata) 27 de novembro de 1905. Até a data eu guardei!

CLESSl (doce)—Irmãs e se odiando tanto! Engraçado—eu acho bonito duas irmãs amando o mesmo homem! Não sei—mas acho!...

ALAÍDE—Você acha?

CLESSI (a sério)—Acho.

(Som de derrapagem. Um grito de mulher. Ambulância. Personagens imóveis.)

ALAÍDE—Mais bonito é ser assassinada por um menino. Um colegial! (noutro tom) Ele usava uniforme cáqui?

CLESSI (doce e evocativa)—De dia, sim. De noite, não.

ALAÍDE—Eu queria ter amado um menino. O seu tinha 17 anos? (a outra confirma) Devia ser muito branco.

CLESSI (inquieta)—Seria tão bom que cada pessoa morta pudesse ver as próprias feições! Eu fiquei muito feia?

ALAÍDE—O repórter disse que não. Disse que você estava linda.

CLESSI (impressionada)—Disse mesmo? Mas... (pausa, com o olhar extraviado) E o talho no rosto? (abstrata) Uma punhalada no rosto não é possível! Foi navalhada, não foi?

(noutro tom) Eu queria tanto me ver morta!

(Aproxima-se dos círios. Hesita. A mulher inatual faz que levanta um invisível lenço a cobrir um invisível rosto.)

CLESSI (espantada)—Gente morta como fica!...

(Foge com Alaíde. A mulher inatual comenta com os companheiros do velório.)

MULHER INATUAL—Parece sorrir.

HOMEM DE BARBA (com um gesto imenso e um tom profundo)—Quem morre descansa.

MULHER INATUAL—O senhor é espírita?

HOMEM DE BARBA (com um gesto ainda mais amplo)—Respeito todas as religiões.

(Pausa. Os dois ajoelham-se, fazem o sinal da cruz e levantam-se.)

MULHER INATUAL (ajeitando qualquer coisa no vestido)—Eu acho que vou-me embora.

HOMEM DE BARBA (depois de olhar para o lado e faunesco)—Já?

MULHER INATUAL—É tarde.

HOMEM DE BARBA (olhando outra vez para os lados)—Mora longe?

MULHER INATUAL—Assim, assim. Mas o lugar é muito escuro. Fico com receio.

HOMEM DE BARBA (concupiscente)—Posso acompanha-la.

MULHER INATUAL—Não vale a pena.

HOMEM DE BARBA (com um novo gesto)—Eu ia sair mesmo.

MULHER INATUAL—Ah, então...

(A mulher vai ao invisível caixão e faz o sinal da cruz. Sai com o homem de barba.)

HOMEM DE BARBA (grave, profundo e pausado)—Aliás eu sou contra mulher andar sozinha tão tarde.

(O moço romântico, indignado, passa pelo invisível cadáver, faz um rápido sinal da cruz e segue adiante. Já ia sair, quando bate na testa, lembrando-se dos círios. Volta e apanha dois círios; o homem de barba faz o mesmo. Trevas. Luz no plano da alucinação. Pedro e Alaíde, de noivos, ajoelhados diante da cruz. Projetor solar vertical. Disco de Ave-Maria, como de Rosa Pancelle.)

VOZ DE LÚCIA (microfone, em crescendo)—Eu faço escândalo. Se eu disser uma coisa que sei!... Não me desafie, Alaíde! Eu é que devia ser a noiva! Você é um monstro! O único homem que eu amei! Nunca me casei com os seus namorados! O que eu não tive foi seu impudor! ...

(Ave-Maria atenuada. De repente surge Lúcia, correndo, vestida de noiva.)

LÚCIA—Pedro!

ALAÍDE—Você?

PEDRO—Ah, você, Lúcia! Até que enfim!

(Lúcia abraça-se a .Pedro. Falam-se quase boca com boca.)

LÚCIA—Demorei, meu filho, porque custei a encontrar a linha branca.

ALAÍDE—Onde é que você achou?

LÚCIA—Na cômoda. Estava na gaveta de baixo.

ALAÍDE (triunfante)—Eu não disse?! Eu tinha posto lá!

PEDRO (cínico)—Se você chegasse um pouquinho mais tarde, o casamento teria se realizado!

LÚCIA (desprendendo-se de Pedro, gritando, com o punho erguido, como na saudação comunista)—Eu é que devia ser a noiva!...

ALAÍDE (excitadíssima, também com o punho erguido)—Mentirosa! Sua mentirosa! Roubei seu namorado e agora ele é meu! Só meu!

LÚCIA (com o punho erguido)—Confessou. Até que enfim! Pelo menos, diga, berre: "Roubei o namorado de Lúcia!!!..."

ALAÍDE (perturbada)—Não digo nada! Não quero!

(Trevas.)

CLESSI (microfone, bem lenta)—Duas noivas! Interessante—duas noivas! Mas que foi que disse o padre, quando Lúcia apareceu? Renda da Bélgica, você mandou buscar. Quanto custou? Não diga. Deixa ver se eu adivinho? Aposto que foi... mais ou menos...

(Luz no alto de uma das escadas laterais, no plano da realidade. Pedro, com roupa normal, falando com o médico de serviço. Projetor vertical sobre os dois.)

PEDRO (comovido)—Eu me chamo Pedro Moreira.

MÉDICO—Pois não.

PEDRO (comovido)—Sou o marido dessa senhora que está sendo operada.

MÉDICO—Caso de atropelamento, não foi?

PEDRO (com angústia)—Sim, doutor. Foi atropelada na Glória. Só ainda agora é que eu soube. Telefonaram para o escritório. (expectante) O estado dela—qual é, doutor? Muito grave?

MÉDICO (reticente)—Bem, o estado dela não é bom.

PEDRO (patético)—Não é bom? (noutro tom) Mas há esperança?

MÉDICO—Sempre há esperança. Está-se fazendo tudo.

PEDRO (agoniado)—E ela sofreu muito, doutor?

MÉDICO—Não. Nada. Chegou em estado de choque. Nem vai sofrer nada.

PEDRO (chocado)—Estado de choque?

MÉDICO—Foi. E isso para o acidentado é uma felicidade. Uma grande coisa. A pessoa não sente nada—nada.

(Trevas. Desce o pano rapidamente.)

FIM DO SEGUNDO ATO

TERCEIRO ATO

(Começa o terceiro ato com o teatro em trevas: Clessi e Alaíde ao microfone.)

CLESSI (microfone)—Talvez você não tenha assassinado seu marido.

ALAÍDE (microfone)—Mas eu me lembro! Foi com um ferro—bati na base do crânio! Aqui.

CLESSI (microfone)—Às vezes, pode ter sido sonho!

ALAÍDE (microfone, com um acento doloroso)—Sonho—será? Estou com a cabeça tão virada! Pode ser que tudo tenha ficado só na vontade!

CLESSI (microfone)—Então aconteceu o quê, na igreja?

(Luz no plano da memória. Estão Clessi e o seu namorado vestidos à maneira de 1905.)

ALAÍDE (microfone)—Estou sempre com a idéia que seu namorado tinha a cara de Pedro!

(Clessi e Pedro sentados, num recamier.)

CLESSI (com o mesmo vestido, mas sem chapéu)—Quer ver meus coelhinhos no quintal?

NAMORADO (frio)—Não.

CLESSI (meiga)—Tem uns tão bonitos! (levantam-se os dois. Ele olha-a, depois senta-se de costas para ela. Clessi anda e volta)

CLESSI (com impaciência e dengue)—Ih! Você é criança demais!

NAMORADO—É o que você pensa!

CLESSI (sentando-se, lânguida)—Então não é?

NAMORADO (com raiva concentrada)—Você acha que eu sou?

CLESSI (com languidez)—Aceitou dinheiro de mim! (provocadora) Não queria, mas aceitou!

NAMORADO (atônito)—Mas foi você que botou no meu bolso! Insistiu!

CLESSI—Estou brincando, bobo! Aquilo não tem nada demais!

NAMORADO (levantando-se)—Você brinca assim comigo e um dia...

CLESSI (brincando)—Você me bate!

NAMORADO (sério)—Clessi...

CLESSI—Senta aqui!

NAMORADO (sentando-se)—(baixo) Sabe o que é que a gente podia fazer?

CLESSI (acariciando-o nos cabelos)—O quê?

NAMORADO—Adivinhe.

CLESSI—Diga.

NAMORADO (baixo)—Morrer juntos. (face a face, os dois) Vamos?

CLESSI (sonhadora)—Você se parece tanto com o meu filho que morreu! Ele tinha 14 anos, mas tão desenvolvido!

NAMORADO (súplice)—Quer?

CLESSI (meiga)—Olhe assim. (pausa, contemplação) Os olhos dele! Direitinho!

(Trevas. Disco de derrapagem, grito, ambulância. Luz no plano da alucinação. Pedro, Alaíde e Lúcia de noivas. Cruz.)

LÚCIA (furiosa, punho erguido)—Diga bem alto, para todo o mundo ouvir: "Roubei o namorado de Lúcia."

ALAÍDE—Digo, sim!

LÚCIA—Diga, quero ver!

ALAÍDE (em alto e bom som)—Roubei o namorado de Lúcia!

LÚCIA (excitada)—Viu, Pedro! Ela disse! Não teve vergonha de dizer!

ALAÍDE (agressiva)—Digo quantas vezes quiser!

PEDRO (cínico)—Briguem à vontade! Não faz mal!

ALAÍDE (repreensiva)—Você não devia dizer isso, Pedro. É cinismo.

LÚCIA (sardônica)—Mas oh! Só agora você soube que ele era cínico! Me admira muito!

ALAÍDE (dolorosa)—Sempre soube.

LÚCIA (com desprezo)—Então por que tirou Pedro de mim?

ALAÍDE—Você sempre com esse negócio de tirou—tirou! (num transporte) É tão bom tirar o namorado das outras. (irônica) Então de uma irmã...

LÚCIA (vangloriando-se)—Você continua pensando que ele é só seu?

ALAÍDE—Penso, não. É.

LÚCIA.—Já lhe disse que é de nós duas, minha filha! Não quer acreditar—melhor!

PEDRO (para Lúcia)—Você não devia dizer isso! Alaíde não precisava saber!

ALAÍDE (patética)—Mas agora sei. Chegou tarde a recomendação.

(Entra a mãe das duas. Vem-se abanando.)

ALAÍDE (excitada)—Foi bom a senhora ter chegado, mamãe!

D. LÍGIA (sempre de leque)—Brigando outra vez!

LÚCIA (acusadora)—É ela, mamãe!

ALAÍDE (indignada)—Eu? Ainda tem coragem!... Mamãe eles estão desejando a minha morte!

D. LÍGIA—Tire isso da cabeça, minha filha. Você não vê logo!

ALAÍDE (patética)—Quando eu morrer, eles vão-se casar, mamãe! Tenho certeza!

PEDRO—Você parece doida, Alaíde!

ALAÍDE (para Lúcia)—Diga agora o que você disse de mamãe!

LÚCIA (virando-lhe ás costas)—Quer me intrigar com mamãe! (para Alaíde) Não adianta!

D. LÍGIA (abanando-se)—Vamos acabar com isso! É feio!

ALAÍDE (com escárnio)—Ela está com medo! (para Lúcia) Não quer dizer?

LÚCIA (resoluta)—Digo, sim. É muito simples. Eu disse...

ALAÍDE (irônica)—Perdeu a coragem?

PEDRO (olhando em torno)—Não tem cadeira. Então vou-me ajoelhar. Ajoelhar também descansa.

(Ajoelha-se diante da cruz.)

D. LÍGIA (repreensiva)—Você precisa respeitar mais a religião, Pedro!

(E vai-se sentar, ao lado de Pedro, de costas para a cruz.)

ALAÍDE (para Lúcia)—Diz ou não diz?

LÚCIA (com certa relutância)—O que eu disse, mamãe, é que a senhora... transpira muito. Demais! Pronto! (para Alaíde) Viu como eu disse?

D. LÍGIA (abanando-se com mais força)—Mas, minha filha! Você teve coragem... Oh! Lúcia!

ALAÍDE (na sua cólera)—Mas não foi só isso!

(Escurecimento total. Voz de Clessi ao microfone.)

CLESSI—Por que você parou no meu caso, Alaíde?

(Réplica que ninguém ouve.)

CLESSI (impaciente)—Já sei! Depois você conta isso! Mas primeiro minha conversa com ele! Era tão parecido com o meu filho, mas tão! E os olhos, Alaíde! Aquele jeito de sorrir! Que é que trazia mais o jornal?

(Luz no plano da alucinação.)

ALAÍDE (cruel)—E aquela história, "aquilo" que você disse?

D. LÍGIA (levantando um dos braços e abanando na altura das axilas)—Chega, Alaíde! Chega! Uma filha, meu Deus!

LÚCIA—Aquilo o quê?

PEDRO (ajoelhado)—Deixe ela dizer, D. Lígia. Está tão interessante!

ALAÍDE (agressiva)—Não se lembra?

LÚCIA (resoluta)—Agora me lembro! Eu também falei, mamãe, que quando a senhora começa a transpirar—a senhora é minha mãe—mas eu não posso! Não está em mim. Tenho que sair de perto!

(Ao mesmo tempo que fala, aproxima-se de D. Lígia e senta-se ao seu lado.)

ALAÍDE (triunfante)—Isso mesmo! Viu, mamãe?

(Alaíde também vem se sentar, ficando ao lado de Pedro.) (Trevas. Luz sobre namorado e Clessi.)

CLESSI (insistente)—Aceite. Não tem nada de mais isso! Tão natural!

NAMORADO (relutante)—Não. Eu sei como você é!

CLESSI—Mas seu pai não tirou a mesada por minha causa? Então? (noutro tom) Assim eu fico zangada!

NAMORADO (relutante)—Para depois você dizer: "aceito dinheiro meu." Pensa que me esqueço?

CLESSI—Aquilo foi brincadeira! Pensou que eu estivesse falando sério?

NAMORADO (vencido)—Então depois eu devolvo. Só assim.

CLESSI—Está bom. Que menino! (noutro tom) Agora vá, meu filho!

NAMORADO (amargo)—Não precisa me enxotar! Eu vou.

CLESSI (conciliatória)—Você sabe por quê! Daqui a pouco o desembargador chega!

NAMORADO (enciumado)—Viu?

CLESSI—O quê?

NAMORADO (amargo)—Eu não tenho nem coragem de reclamar, depois que aceitei coisas de você.

CLESSI (explicando)—Você sabe que ele é um velho amigo!

NAMORADO (animado)—Só isso? Jura!

CLESSI (categórica)—Então! Me conheceu menina!

NAMORADO (num repente sinistro)—Eu acabo matando você por causa desse desembargador! Você vai ver!

(Entra a mãe do namorado, vestida à maneira de 1905.)

NAMORADO (em pânico)—Mamãe!

(Clessi levanta-se.)

MÃE (com raiva concentrada)—Eu bem sabia! Tinha a certeza que você estava aqui!

NAMORADO—A senhora vai fazer o quê?

MÃE (autoritária)—Vá para casa, Alfredo!

CLESSI (doce)—Vá. Sua mãe está mandando! (O namorado sai, depois de tomar a bênção materna)

MÃE (num largo gesto, visivelmente caricatural, trêmulo na voz)—A senhora é que é madame Clessi?

CLESSI (humilde)—Sou. A senhora não quer sentar-se?

MÃE (em tom de dramalhão)—Não. Estou bem assim. (exageradíssima) Sou a mãe de Alfredo Germont.

CLESSI (humilde)—Eu sei.

MÃE (com tremura na voz)—Então a senhora não tem consciência?

CLESSI (chocada, mas doce)—Eu?

MÃE (cada vez mais patética)—A senhora, sim. Então isso se faz? Com uma criança?

CLESSI (suave e dolorosa)—Mas que culpa tenho eu?

MÃE—Que culpa! (noutro tom) Um menino, uma verdadeira criança, chegando em casa às duas, três, quatro horas da manhã! A senhora não vê?

(Trevas. Voz de Alaíde.)

ALAÍDE (microfone)—Mas eu estou confundindo tudo outra vez, minha Nossa Senhora! Alfredo Germont é de uma ópera! Traviata. Foi Traviata! O pai do rapaz veio pedir satisfações à mocinha. Como ando com a cabeça, Clessi!

(Luz no plano da memória. Clessi e mãe do namorado. Tom diferente de representação, mas ainda caricatural.)

CLESSI (choramingando)—O olhar daquele homem despe a gente!

MÃE (com absoluta falta de compostura)—Você exagera, Scarlett!

CLESSI—Rett é indigno de entrar numa casa de família!

MÃE (cruzando as pernas; incrível falta de modos)—Em compensação, Ashley é espiritual demais. Demais! Assim também não gosto.

CLESSI (chorando, despeitada)—Ashley pediu a mão de Melânie! Vai-se casar com Melânie!

MÃE (saliente)—Se eu fosse você, preferia Rett (noutro tom) Cem vezes melhor que o outro!

CLESSI (chorosa)—Eu não acho!

MÃE (sensual e descritiva)—Mas é, minha filha! Você viu como ele é forte? Assim! Forte mesmo!

(Trevas.)

ALAÍDE (microfone)—Você está vendo, Clessi? Outra vez. Penso que estou contando o seu caso, contando o que li nos jornais daquele tempo sobre o crime, e quando acaba, misturo tudo! Misturo Traviata, ...E o vento levou..., com o seu assassínio! Incrível. (pausa) Não é?

(Luz no plano da memória. Clessi e mãe do namorado já em atitude normal.)

MÃE (ameaçadora)—É a última vez que eu pergunto. Desiste ou não desiste?

CLESSI (com doçura)—Peça tudo, tudo, menos isso. Isso, não.

MÃE (agressiva)—Então vou entregar o caso à polícia. Aí quero ver.

CLESSI (sonhadora)—Tenho chorado tanto! (noutro tom) Nunca tive um amor. É a primeira vez. A senhora, se já amou, compreenderá.

MÃE (perdendo a cabeça)—Indigna!

CLESSI (com a mesma doçura)—Eu sei que sou. Sei (rindo e chorando) Se a senhora visse como ele se zanga, quando eu falo no desembargador!

MÃE (tapando o rosto com a mão)—Meu filho metido com uma mulher desmoralizada! Conhecida!

CLESSI (no mesmo tom de abstração, senta-se)—Então quando eu boto dinheiro no bolso dele!

MÃE—Mentirosa!

CLESSI (sempre doce)—Ele, tão cheio de dedos para aceitar!

MÃE—Vou falar com meu marido! (ameaçadora) Ah! se isso for verdade!

(Vai saindo, mas Clessi muda de atitude e grita violentamente.)

CLESSI—Olha! (Mãe, pára, atônita) Você, sim! (Aproxima-se, agressiva, da mãe, que recua, em pânico.) Se vier outra vez à minha casa, corro com você daqui!

MÃE (as duas, face a face)—(Acovardando-se) Mas que é isso?

CLESSI (violenta)—Eu não sou direita, mas digo. Não escondo. Está ouvindo? Saia, já!

(Sai a mãe alarmada. Trevas. Luz no plano da realidade. Redação e sala de imprensa.)

1° FULANO (berrando)—Diário!

2° FULANO (berrando)—Me chama o Osvaldo?

1° FULANO—Sou eu.

2° FULANO—É Pimenta. Toma nota.

1° FULANO—Manda.

2° FULANO—Alaíde Moreira, branca, casada, 25 anos. Residência, Rua Copacabana. Olha...

1° FULANO—Que é?

2° FULANO—Essa zinha é importante. Gente rica. Mulher daquele camarada, um que é industrial, Pedro Moreira.

1° FULANO—Sei, me lembro. Continua.

2° FULANO—Afundamento dos ossos da face. Fratura exposta do braço direito. Escoriações generalizadas. Estado gravíssimo.

1° FULANO—...generalizadas. Estado gravíssimo.

2° FULANO—O chofer fugiu. Não tomaram o número. Ainda está na mesa de operação.

(Trevas. Luz no plano da alucinação. Estão Alaíde e Clessi imóveis. Rumor de derrapagem. Grito de mulher. Ambulância.)

CLESSI—O que é que ela disse mais no jornal?

ALAÍDE—Disse que você tinha dito: "Saia, já." Que ela teve medo de ser assassinada!

CLESSI—No dinheiro que eu dava não tocou?

ALAÍDE—Quem falou ao repórter no dinheiro foi a criada!

CLESSI (sardônica)—Imagine!

ALAÍDE (nervosa)—Ele vem aí, Clessi! Pedro!

CLESSI—Mas você não tinha assassinado ele?

ALAÍDE—Pensei que tivesse. Mas deve ter sido sonho! Olha ele!

(Entra Pedro, de luto. Alaíde vai ao seu encontro, sorrindo.)

ALAÍDE—Dá licença, Clessi? (para Pedro, de luto) Então, meu filho? (beijam-se)

PEDRO (admirado, confidencial)—Quem é ela?

ALAÍDE (como quem se escusa)—Ah! É mesmo! Me esqueci de apresentar! Clessi, Madame Clessi! Aqui, meu marido!

PEDRO (amável)—A senhora é uma que foi assassinada?

CLESSI—Pois não.

ALAÍDE—Foi, sim. Em 1905. Aquela que eu lhe contei, Pedro.

PEDRO—Eu me lembro perfeitamente. O namorado era um colegial, não é? Deu uma punhalada?

CLESSI (sonhadora)—De dia, usava uniforme cáqui. De noite, não.

ALAÍDE—Agora quer dar licença, Clessi?

CLESSI—Claro.

ALAÍDE—Preciso falar com Pedro uma coisa. Depois chamo você.

PEDRO (para Clessi, que sai, cínico)—Apareça!

(Clessi, antes de sair, ainda se vira para ele e cumprimenta.)

PEDRO (com súbita irritação)—Que negócio é esse de você andar falando com Madame Clessi?

ALAÍDE (atarantada)—Que é que tem demais, meu filho?

PEDRO (com veemência)—Ela não é direita! Não quero essas relações!

ALAÍDE (exaltando-se)—Ela não é direita! E você é "direito"—é? Você pensa que eu não sei de nada? Pensa mesmo?

PEDRO (espantado)—Não sabe o quê?

ALAÍDE (excitada)—Que você e Lúcia... (ameaçadora) Sim, você e Lúcia! Andam desejando a minha morte!

PEDRO (virando-lhe as costas)—Você está doida.

ALAÍDE—Doida, eu! Você sabe que não! Então eu não vejo?

PEDRO (volta a ficar de frente)—O que é que você vê?

ALAÍDE—Vocês cochichando! Eu apareço (sardônica) vocês arranjam logo um assunto diferente, muito diferente, ficam tão naturais.

PEDRO (irônico)—Você tem imaginação, minha filha!

ALAÍDE—Dia e noite, desejando que eu morra! Eu sei para que é! Para se casarem depois da minha morte!

PEDRO (num tom especial)—Então você acha?... Sério?...

ALAÍDE (numa excitação progressiva)—Já planejaram tudo! Todo o crime! Assassinato sem deixar vestígios!

PEDRO (sardônico)—Autêntico crime perfeito!

CLESSI (microfone)—Que dois! Planejando um crime!

ALAÍDE (sempre excitada)—Ainda por cima se faz de inocente! Mas eu pego vocês dois—direitinho! Deixa estar!

(Lúcia entra, como uma aparição. Vem de luto fechado.)

LÚCIA—Ah! Vocês estão aí?

ALAÍDE (triunfante)—Pronto! Chegou a cúmplice! Vocês estão tão certos da minha morte que até já botaram luto!

LÚCIA (inocente)—O que é que há?

PEDRO (apontando para a testa)—É Alaíde que não está regulando bem!

ALAÍDE (fremente, para Lúcia)—Venha repetir para meu marido aquilo que você disse, "aquilo"! No dia do meu casamento!

LÚCIA—Sei lá de que é que você está falando?

CLESSI (microfone)—Irmã assim é melhor não ter!

ALAÍDE—Sabe, sim. Sabe! Aquela insinuação que você fez... Que eu podia morrer!

LÚCIA (virando-lhe as costas)—Você está sonhando, minha filha. Disse coisa nenhuma!

ALAÍDE—Covarde! Agora está com medo! Mas disse—disse a mim!

PEDRO—Mas se ela nega, Alaíde!

LÚCIA (noutra atitude)—Pois disse! Pronto! Disse! E agora?

ALAÍDE (patética)—Então me mate! Por que não me matam? Estamos sozinhos! Depois vocês escondem o meu corpo debaixo de qualquer coisa! (e, à medida que ela fala, os três se aproximam, juntam as cabeças)

(As cabeças baixam, seguindo o ritmo das palavras.)

PEDRO (sinistro)—Agora, não! Tem tempo!

(Quando ele acaba, tem-se a impressão plástica de um bouquet de cabeças. Trevas. Luz no plano da realidade: rumor de f erros cirúrgicos.)

1° MÉDICO—Pulso?

2° MÉDICO—Incontável... Não reage mais!

1° MÉDICO—Colapso!

3° MÉDICO—Pronto!

(Um dos médicos está cobrindo o rosto de uma mulher. Saem os médicos lentamente, um deles tirando a máscara. Marcha Fúnebre. Trevas. Luz no plano da alucinação. Alaíde e Clessi de costas para a platéia. Alaíde com um bouquet, no qual está dissimulado o microfone. Luz no plano da realidade: botequim e redação.)

PIMENTA (berrando)—Morreu a fulana.

REPÓRTER (berrando e tomando nota)—Qual?

PIMENTA—A atropelada da Glória.

REPÓRTER—Que mais?

PIMENTA—Chegou aqui em estado de choque. Morreu sem recobrar os sentidos; não sofreu nada.

REPÓRTER—Isso é o que você não sabe!

PIMENTA—A irmã chora tanto!

REPÓRTER—Irmã é natural!

PIMENTA—Um chuchu!

REPÓRTER—Quem?

PIMENTA—A irmã.

(Trevas. Luz no piano da realidade: Lúcia e Pedro. Lúcia chorando. Coroas. Luz também no plano irreal.)

ALAÍDE—Quem terá morrido ali, naquela casa?

CLESSI—Olha! Uma fortuna em flores!

ALAÍDE—Enterro de gente rica é assim.

CLESSI—O meu também teve muita gente, não teve?

ALAÍDE—Pelo menos, o jornal disse.

(No plano da realidade.)

PEDRO (em voz baixa)—Lúcia!

LÚCIA (tomando um choque, levantando-se)—Que é? Que horas são?

PEDRO—3 horas.

LÚCIA—Fique longe de mim! Não se aproxime!

PEDRO—Mas que é isso?

LÚCIA (com ódio concentrado)—Nunca mais! Nunca mais quero nada com você! Juro!

PEDRO—Você enlouqueceu? O que é que eu fiz?

LÚCIA (obstinada)—Jurei diante do corpo de Alaíde!

PEDRO (chocado)—Você fez isso?

LÚCIA (com decisão)—Fiz. Fiz, sim. Quer que eu vá na sala e jure outra vez? (mergulha a cabeça entre as mãos) Ontem, antes dela sair para morrer, tivemos uma discussão horrível!

PEDRO (baixo)—Ela sabia?

LÚCIA (patética)—Sabia. Adivinhou o nosso pensamento. E eu disse.

PEDRO—Mas comigo nunca tocou no assunto.

LÚCIA—Discutimos quantas vezes! Ameacei-a de escândalo. Mas ontem, foi horrível—horrível! Sabe o que ela me disse? "Nem que eu morra, deixarei você em paz!"

(Lúcia fala com a cabeça entre as mãos. Alaíde responde através do microfone escondido no bouquet. Luz cai em penumbra, durante todo o diálogo evocativo.)

ALAÍDE (com voz lenta e sem brilho)—Nem que eu morra, deixarei você em paz!

LÚCIA (falando surdamente)—Pensa que eu tenho medo de alma do outro mundo?

ALAÍDE (microfone)—Não brinque, Lúcia! Se eu morrer—não sei se existe vida depois da morte, mas se existir—você vai ver!

LÚCIA (sardônica)—Ver o quê, minha filha?

ALAÍDE (microfone)—Você não terá um minuto de paz, se casar com Pedro! Eu não deixo—você verá!

LÚCIA (irônica)—Está tão certa assim de morrer?

ALAÍDE (microfone)—Não sei! Você e Pedro são capazes de tudo! Eu posso acordar morta e todo o mundo pensar que foi suicídio.

LÚCIA—Quem sabe? (noutro tom) Eu mandei você tirar Pedro de mim?

ALAÍDE (microfone)—Mas que foi que eu fiz, meu Deus?

LÚCIA (sardônica)—Nada!

ALAÍDE (microfone)—Fiz o que muitas fazem. Tirar um namorado! Quer dizer, uma vaidade... (com veemência) Você, não! Você e Pedro querem-me matar. Isso, sim, é que é crime, não o que eu fiz!

LÚCIA (irritante)—Mas conquistou Pedro tão mal que ele anda atrás de mim o dia todo!

ALAÍDE (microfone)—Sabe para onde eu vou agora?

LÚCIA—Não me interessa!

ALAÍDE—E nem digo—minha filha! Vou ter uma aventura! Pecado. Sabe o que é isso? Vou visitar um lugar e que lugar! Maravilhoso! Já fui lá uma vez!

LÚCIA (sardônica)—Imagino!

ALAÍDE (com provocação)—Na última vez que fui, tinha duas mulheres dançando. Mulheres com vestidos longos, de cetim amarelo e cor-de-rosa. Uma vitrola. Olha: querendo, pode dizer a Pedro. Não me incomodo. Até é bom!

LÚCIA (sardônica)—Mentirosa!

ALAÍDE (microfone)—Ah! Sou?

LÚCIA (afirmativa, elevando a voz)—É! Não foi lá, nunca! Nunca! Tudo isso que você está contando—as duas mulheres, os vestidos de cetim, a vitrola—você leu num livro que está lá em cima! Quer que eu vá buscar? Quer?

ALAÍDE (microfone)—Está bem, Lúcia. Não fui, menti. (dolorosa)

LÚCIA (cruel)—Você podia ir e ficar por lá!

ALAÍDE (microfone)—Ouça bem. Eu posso morrer cem vezes, mas você não se casará com Pedro.

(Luz volta a ser normal.)

LÚCIA (impressionadíssima, agora para Pedro)—Agora, quando penso em Alaíde, só consigo vê-la de noiva.

PEDRO (taciturno)—Foi isso que ela disse, só?

LÚCIA (sombria)—Só. Previa que ia morrer!

PEDRO (com certa ironia)—Isso também nós prevíamos.

LÚCIA—Você diz "nós"!

PEDRO (afirmativo)—Digo, porque você também previa. (pausa) Previa e desejava. Apenas não pensamos no atropelamento. Só.

LÚCIA (com desespero)—Foi você quem botou isso na minha cabeça—que ela devia morrer!

PEDRO (com cinismo cruel)—Então não devia?

LÚCIA (desesperada)—Você é um miserável! Nem ao menos espera que o corpo saia! Com o corpo, ali, a dois passos. (aponta para a direção do que deve ser a sala contígua) Você dizendo isso!

PEDRO (insinuando)—Quem é o culpado?

LÚCIA (espantada)—Eu, talvez!

PEDRO (enérgico)—Você, sim!

LÚCIA (espantada)—Tem coragem...

PEDRO—Tenho. (com veemência) Quem foi que disse: "Você só toca em mim, casando!" Quem foi?

LÚCIA—Fui eu, mas isso não quer dizer nada!

PEDRO (categórico)—Quer dizer tudo! Tudo! Foi você quem me deu a idéia do "crime"! Você!

LÚCIA (com medo)—Você é tão ruim, tão cínico, que me acusa!

PEDRO (com veemência, mas baixo)—Ou você ou ela tinha que desaparecer. Preferi que fosse ela.

LÚCIA (com angústia)—Essa conversa quase diante do caixão!

PEDRO (sempre baixo)—Não estudamos o "crime" em todos os detalhes? Você nunca protestou Você é minha cúmplice.

LÚCIA (alheando-se, espantada)—Mandaram tantas flores!

PEDRO (insistente)—Agora você se acovarda porque o corpo ainda está aqui!

LÚCIA (meio alucinada)—Você se lembra do que ela dizia? Daquela vaidade?

VOZ DE ALAÍDE (microfone)—Eu sou muito mais mulher do que você—sempre fui!

LÚCIA (noutra atitude)—Foi você quem perdeu minha alma!

PEDRO (rápido)—E você a minha!

LÚCIA (sardônica)—Você nunca prestou! Foi sempre isso! Não me olhe, que não adianta!

PEDRO—Está bem. Depois eu falo com você.

LÚCIA—É inútil. Não serei de você, nem de ninguém. Você nunca me tocará, Pedro.

PEDRO—Você diz isso agora!

LÚCIA—Jurei que nem um médico veria o meu corpo.

PEDRO (cruel)—Então ela ficou impressionadíssima com as mulheres vestidas de amarelo e cor-de-rosa. Uma vitrola! Duas fulanas dançando!

LÚCIA (chorosa)—Não fale assim! Ela está ali. Morreu.

PEDRO (sardônico)—Era louca por toda mulher que não prestava. Vivia me falando em Clessi. Uma desequilibrada!

LÚCIA (revoltada)—Você deve estar bêbedo para falar assim!

PEDRO (sério)—Ou louco... (grave) Não tenho o menor medo da loucura.

(Trevas.)

Speaker—Pedro Moreira, Gastão dos Passos Costa, senhora e filha, Carmen dos Passos, Eduardo Silva e senhora (ausentes), Otávio Guimarães e senhora, agradecem, sensibilizados, a todos que compareceram ao sepultamento de sua inesquecível esposa, filha, irmã, sobrinha e cunhada Alaíde e convidam parentes e amigos para a missa de 7° dia, a realizar-se sábado, 17 do corrente, na Igreja da Candelária, às 11 horas.

(Luz no plano da realidade: Lúcia e mãe.)

LÚCIA (como uma louca)—Você viu o que saiu no jornal? "Alaíde Moreira, branca, casada... (sardônica) Branca!... (surdamente) "fratura exposta do braço direito. Afundamento dos ossos da face"...

MÃE (assustada)—Não fique assim, Lúcia!

LÚCIA (continuando sem dar atenção)—"... escoriações generalizadas"... "Não resistindo aos padecimentos"... (com voz surda) Sei isso de cor, mamãe! De cor!

MÃE—Minha filha!

LÚCIA (espantada)—Está ouvindo, mamãe? Ela outra vez! Ela voltou—não disse?

MÃE—Não é nada, minha filha. Ilusão sua.

LÚCIA (atônita)—Mas eu ouço a voz dela. Direitinho! Falando!

MÃE—Você parece criança, minha filha!

LÚCIA (com ar estranho)—Não foi nada. Bobagem.

ALAÍDE (microfone)—"Você sempre desejou a minha morte. Sempre—sempre."

MÃE—Quando você for para a fazenda, tudo isso passa. Lá o clima é uma maravilha!

(Trevas. Só microfone.)

PAI (microfone)—Que é que há com Lúcia e Pedro?

MÃE (microfone)—Que eu saiba, nada. Por quê?

PAI (microfone)—Você não viu ontem?

MÃE (microfone)—Aquilo?

PAI (microfone)—É. Foi esquisito.

MÃE (microfone)—Talvez tenha sido sem querer.

PAI (microfone)—Sem querer coisa nenhuma.

MÃE (microfone)—Lúcia anda tão nervosa! Mas eu falo com ela.

PAI (microfone)—Não se meta.

MÃE (microfone)—Ela ontem me disse uma coisa! Enfim...

(Luz no plano da realidade: pai e mãe de Lúcia, esta e D. Laura. Lúcia chega de viagem.)

LÚCIA—Mãe! Quantas saudades!

PAI—Eu não mereço.

LÚCIA—Papai!

MÃE—Está tão mais gorda, corada—não é, Gastão?

PAI—Muito mais.

D. LAURA—Depois, quando a gente tira o luto, é outra coisa!

LÚCIA—Ah, D. Laura! Nem tinha visto a senhora!

(Saem D. Laura e mãe de Lúcia.)

PAI (confidencial)—Já resolveu?

LÚCIA—O que é que o senhor acha, papai?

PAI—Isso é com você, minha filha; você é quem tem que decidir.

(Trevas. Luz sobre Alaíde e Clessi, poéticos fantasmas. Iluminam-se as duas divisões extremas do plano da realidade. À direita do público, sepultura de Alaíde. À esquerda, Lúcia, vestida de noiva, prepara-se no espelho. Arranjo da Marcha Nupcial e da Marcha Fúnebre.)

LÚCIA—Aperta bem, mamãe.

LÚCIA—Está muito folgado aqui!

LÚCIA—Será que Pedro já chegou?

MÃE—D. Laura aparece, quando ele chegar.

LÚCIA (retocando qualquer coisa ao espelho)—Eu só quero que ele me veja lá na igreja.

(Entra D. Laura.)

D. LAURA—Pode-se ver a noiva?

LÚCIA—Ah! D. Laura!

(Beijam-se.)

D. LAURA (para a mãe)—A senhora deve estar muito atrapalhada!

MÃE—Nem faz idéia!

LÚCIA (com dengue)—Estou muito feia, D. Laura?

D. LAURA—Linda! Um amor!

LÚCIA (estendendo os braços)—O bouquet.

(Crescendo da música, funeral e festiva. Quando Lúcia pede o bouquet, Alaíde, como um fantasma, avança em direção da irmã, por uma das escadas laterais, numa atitude de quem vai entregar o bouquet. Clessi sobe a outra escada. Uma luz vertical acompanha Alaíde e Clessi. Todos imóveis em pleno gesto. Apaga-se, então, toda a cena, só ficando iluminado, sob uma luz lunar, o túmulo de Alaíde. Crescendo da Marcha Fúnebre. Trevas.)

FIM DO TERCEIRO E ÚLTIMO ATO

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